Aprenda a separar desconto tático de desconto destrutivo e use pricing + planilha de precificação para proteger margem sem perder negócios no B2B.

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Em muitas empresas, quando o cliente pede desconto, a reação é previsível: o vendedor concede para não perder o negócio, o gestor aprova para bater a meta do mês e o deal entra como “ganho”. Só que, quando alguém olha a margem com calma, descobre que aquele “ajuste” cortou uma fatia relevante do lucro planejado.
O problema não é o desconto em si. O problema é quando o time passa a depender do desconto como único caminho para fechar.
O objetivo aqui é olhar o desconto como sintoma de um sistema de pricing mal desenhado, e não como vilão isolado. A partir disso, fica mais fácil entender:
- por que pequenas concessões têm impacto enorme em lucro;
- como separar desconto tático de desconto destrutivo;
- como usar uma planilha de precificação para proteger a margem sem travar o fechamento.
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ToggleO desconto não começa no vendedor: começa no sistema de pricing
Quando quase todo contrato grande depende de desconto para fechar, e é comum a liderança buscar culpados na ponta. Em uma semana o alvo é o vendedor que “não sabe defender valor”. Na outra, é o marketing que “atrai lead fora do perfil”. Em seguida, o discurso muda para “nosso mercado só compra preço”. Esse tipo de explicação alivia a ansiedade, mas não resolve a causa.
Em operações B2B com ticket alto, o problema quase nunca é individual. Ele é estrutural. Em projetos de consultoria, é frequente encontrar três camadas do sistema desalinhadas quando o desconto vira padrão de fechamento:
- Como a empresa define preço, margem e pacotes comerciais;
- Como a proposta comunica valor percebido, risco evitado e impacto financeiro.
A terceira camada é a forma como a equipe negocia. Sem narrativa consistente de valor e sem limites claros de concessão, a pressão do comprador empurra o time para o atalho do desconto. Em muitos casos, o próprio modelo de comissionamento reforça esse comportamento. Se o bônus recompensa apenas faturamento e velocidade, sem olhar margem nem perfil de cliente, o vendedor é incentivado a “comprar” negócio com desconto para ganhar no volume. Esse ponto é destrinchado em detalhes no artigo da Receita Previsível “Guia completo de comissionamento”.
Quando o sistema empurra o time para concessão rápida, a empresa até cresce em receita, mas passa a sentir aquele incômodo conhecido: muito esforço comercial para pouco resultado em lucro.
Por que pequenos descontos derrubam sua margem
O efeito do desconto na margem é menos intuitivo do que parece. Não se trata apenas de “ganhar um pouco menos neste contrato”.
Análises da Bain & Company com empresas B2B mostram que 1 ponto percentual de melhoria no preço realizado pode gerar, em média, cerca de 8% a mais de lucro operacional (assumindo volume constante).
Na direção contrária, o impacto também é grande. O artigo “Mathematics of Pricing – The Impact of Price Increase or Price Discount”, da RealTime CEO, mostra que uma operação com margem de contribuição de 30% precisa aumentar o volume em 50% para compensar um desconto de 10% e voltar ao mesmo resultado em dinheiro.
Isso muda a leitura do “desconto para não perder”. Aquele contrato de 100 mil que vai para 90 mil não é detalhe. É uma decisão que exige muito mais vendas futuras para recompor o lucro que ficou na mesa.
Como a Receita Previsível enxerga desconto, preço e valor percebido
Na visão da Receita Previsível, desconto não é proibido e também não é solução. É uma alavanca tática dentro de um sistema de pricing bem desenhado.
Para esse sistema funcionar, preço não pode ser discutido isoladamente. Ele precisa estar amarrado a valor percebido. E valor percebido não é só funcionalidade: inclui redução de risco, economia de tempo, previsibilidade e consistência da jornada.
Um estudo global da PwC (“Experience is everything: Here’s how to get it right”) mostra que consumidores estão dispostos a pagar até 16% a mais quando percebem uma experiência de compra significativamente melhor. Embora o levantamento seja voltado ao consumidor final, a lógica se repete no B2B: quando a empresa entrega mais clareza, segurança e consistência, preço perde o posto de único critério.
Por isso, uma estratégia de pricing saudável começa por definição de valor e posicionamento. Só depois entra a discussão de faixa de preço, margens-alvo e regras de flexibilidade.
Se a diferença entre preço e valor ainda gera ruído na sua operação, vale complementar com o artigo da Receita Previsível “Preço x valor: entendendo a diferença e o impacto nas vendas”.
O que precisa existir antes da negociação começar
Negociação B2B não começa quando o cliente pede desconto. Ela começa muito antes, na forma como a empresa estrutura seu pricing e prepara o time para falar sobre isso. Operações que entram em reunião com preço solto, sem referência clara de custo e margem, acabam reféns da pressão do comprador.
Antes de qualquer proposta, alguns pontos precisam ser definidos. A empresa precisa saber quanto custa, em termos diretos e indiretos, entregar cada tipo de projeto. Precisa ter clareza sobre qual margem mínima faz sentido para o negócio, considerando estrutura, investimentos e risco. Precisa também de uma lista organizada de preços por segmento de cliente, complexidade e escopo, em vez de trabalhar com números diferentes a cada negociação.
Esse conhecimento não pode ficar concentrado na cabeça do founder ou do financeiro. Precisa virar ferramenta concreta para o time comercial. O jeito mais simples de fazer isso é transformar essas informações em uma planilha de precificação viva, que consolide custos, margens, preços de lista e limites de desconto em um só lugar. A partir daí, cada negociação deixa de ser um chute isolado e passa a ser uma decisão tomada dentro de um modelo.
Desconto tático vs. desconto destrutivo
Nem todo desconto é igual.
Desconto tático
Quando a empresa troca parte da margem por algo com valor estratégico mensurável, como:
- contrato de maior duração;
- aumento de escopo;
- caso público/estudo de caso;
- acesso a comitês decisores;
- potencial real de expansão.
Desconto destrutivo
Quando é concedido por medo de perder o negócio, sem contrapartida objetiva, sem registro e sem análise de impacto no resultado.
Com o tempo, esse padrão educa o mercado: pedir desconto vira “etapa obrigatória”. E a equipe passa a tratar concessão como reflexo.
Quando o time passa a avaliar cada pedido à luz da planilha e da estratégia de carteira, a conversa muda: em vez de “quanto dá para tirar”, vira “qual troca justifica essa concessão sem comprometer a saúde do contrato”.
Rituais de negociação que reduzem concessões desnecessárias
Sistema de pricing sem rotina de negociação vira documento esquecido em pasta compartilhada. Times que protegem margem tratam conversas de preço como parte da gestão, e não como improviso do vendedor na sala. Isso começa com rituais simples e recorrentes.
Revisões rápidas de deals em andamento, por exemplo, ajudam o gestor a identificar negociações com alto risco de concessão excessiva antes que o desconto seja oferecido. Role plays frequentes, em que vendedores treinam objeções de preço e simulam mesas de compras, aumentam o repertório e a sensação de segurança. Quando as principais objeções aparecem primeiro dentro de casa, com colegas, elas chegam mais fracas na reunião com o cliente.
Esse tipo de prática é o que transforma negociação em habilidade treinável, em vez de talento individual. Para aprofundar táticas concretas, vale consultar o conteúdo
Técnicas de negociação: 7 estratégias para aumentar suas taxas de fechamento. O objetivo é fazer com que o time se sinta capaz de sustentar valor e conduzir a conversa, em vez de apenas reagir à pressão com desconto.
Métricas que alinham vendas, margem e valor
Quando a área comercial é cobrada apenas por receita fechada e o financeiro olha apenas para lucro agregado, surgem incentivos conflitantes. O vendedor é recompensado por qualquer negócio que entre. O financeiro reclama da margem apertada. A liderança sente que todo mundo trabalha muito, mas o resultado líquido não acompanha.
A forma de corrigir esse desalinhamento é trazer métricas compartilhadas para a rotina. Acompanhar margem média por segmento de cliente, e não só por produto, ajuda a entender onde o desconto virou padrão cultural. Monitorar qual porcentual dos contratos fechou abaixo da margem mínima e em que condições revela se as exceções estão realmente sob controle. Observar a diferença entre preço de lista e preço realizado mostra o quanto a política de desconto está corroendo o resultado.
Quando esses indicadores entram em reuniões de forecast e revisão de pipeline, o assunto deixa de ser apenas “quantos contratos vamos fechar” e passa a ser “qual a qualidade econômica dos contratos que estamos trazendo”. A conversa fica mais madura e o sistema começa a valorizar não só volume, mas lucratividade.
Exemplo prático: o desconto que parecia pequeno e derrubou metade da margem
Imagine uma empresa de software que fecha um contrato de 100 mil (receita recorrente anual), com margem planejada de 30%. Isso significa 30 mil de resultado.
O cliente pressiona, o vendedor concede 15% e o contrato vai para 85 mil.
Os custos do projeto, porém, continuam praticamente iguais. Na prática, a margem em dinheiro cai de 30 mil para 15 mil. Um desconto de 15% derrubou 50% da margem planejada.
Se isso se repete, o faturamento sobe, mas a capacidade de reinvestir, contratar, evoluir produto e segurar talentos fica comprometida. Quando esse exemplo entra na planilha e fica visível para o time, desconto deixa de parecer “detalhe”.
Liderança como guardiã da margem e do valor percebido
Em empresas com receita recorrente, o papel da liderança comercial vai além de encher o funil. A diretoria precisa cuidar da coerência entre o que é prometido na venda, o preço cobrado e o valor realmente entregue. Isso inclui recusar negócios que não fazem sentido econômico, mesmo que ajudem a bater meta no curto prazo, e evitar políticas de desconto agressivas que a operação não consegue sustentar.
As pesquisas da PwC em experiência do cliente reforçam por que essa postura faz diferença. No estudo “Experience is everything”, a consultoria mostra que clientes dispostos a pagar até 16% a mais por uma experiência melhor também tendem a ser mais leais e a comprar outros produtos da mesma marca. Em outras palavras, existe prêmio de preço disponível para empresas que entregam valor e consistência, não só para quem pratica o menor valor da tabela.
Quando a liderança assume o papel de guardiã da margem e do valor percebido, o recado para o time muda. O vendedor entende que proteger preço faz parte do trabalho, ao lado de bater meta. E isso aparece diretamente na postura diante do pedido de desconto.
Transforme desconto em ferramenta tática com a planilha de precificação
Até aqui, o raciocínio parece conceitual, mas o movimento de mudança é bem prático. O ponto central é transformar preço, margem e limites de desconto em um mapa compartilhado. Uma planilha de precificação bem construída cumpre exatamente esse papel.
Essa ferramenta reúne em um único lugar custos diretos e indiretos, margens alvo, preços de lista e pisos aceitáveis por tipo de projeto e perfil de cliente. A partir daí, o gestor deixa de aprovar desconto com base apenas em sensação e passa a decidir olhando números. O vendedor, por sua vez, ganha argumentos concretos para sustentar valor na mesa de negociação.
Na prática, a planilha de precificação pode ser usada para:
- Simular diferentes níveis de desconto e enxergar, em segundos, quanto de margem e quanto de volume adicional seriam necessários para manter o resultado
- Definir faixas de negociação por tamanho de contrato e segmento, deixando claro para o time até onde cada papel pode ir sem romper a saúde econômica do negócio
Ao incorporar essa planilha nas reuniões de forecast, nos treinamentos de negociação B2B e nas conversas de aprovação de propostas, a empresa tira o desconto do improviso e o coloca dentro de um sistema. O próximo passo natural é disponibilizar essa ferramenta para o time e usá-la como base para revisar preços atuais, margens mínimas e políticas de flexibilidade. Baixar a planilha de precificação e adaptar os campos à realidade da sua operação pode ser o primeiro tijolo concreto de um sistema de crescimento previsível e lucrativo.
Perguntas frequentes sobre desconto, pricing e margem em vendas B2B
1) Como saber se estou perdendo negócios por preço ou por falta de valor percebido?
Se a objeção aparece muito cedo (na descoberta), costuma ser segmentação/posicionamento. Se aparece na proposta, muitas vezes é falta de clareza de impacto/retorno e a prioridade é reforçar valor, não reduzir tabela.
2) Todo time comercial deve ter liberdade para negociar desconto?
Liberdade total tende a gerar disparidade, erosão de margem e ruído interno. Operações maduras trabalham com bandas por papel: vendedor dentro da faixa, gestor acima do limite, diretoria para exceções.
3) Como conectar política de desconto com comissionamento?
Se comissão premia só volume, o vendedor aprende que qualquer negócio serve, mesmo com margem baixa. Uma alternativa é incorporar margem mínima, aderência ao ICP e mix de produto na variável. O artigo “Guia completo de comissionamento” aprofunda caminhos.
4) Quando faz sentido usar desconto como entrada?
Quando existe contrapartida clara (prazo maior, expansão, caso público, acesso a cluster relevante) e respeita a margem mínima. E a exceção precisa ser registrada para alimentar revisão de pricing.
5) Uma planilha de precificação resolve sozinha o desconto excessivo?
Ela é peça central, mas não atua sozinha. Precisa vir junto de narrativa de valor, treinamento de negociação e rituais de gestão com métricas (margem por segmento, preço de lista vs realizado, % abaixo do piso). Quando isso se conecta, desconto deixa de ser muleta e vira ferramenta tática.